segunda-feira, 13 de julho de 2009

Bola de Neve Online

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Relatório

Introdução
Considerando o visível crescimento numérico do número de jovens evangélicos no Brasil (crescimento esse já confirmado estatisticamente, como falamos em post anterior), fomos a campo com o objetivo de identificar o que tem atraído essa parcela da população pra dentro das igrejas. Inicialmente, planejamos realizar nossa pesquisa nas igrejas Bola de Neve Church e Universal do Reino de Deus, devido às notáveis inovações que estas têm inserido no meio evangélico. Porém, com o desenrolar da pesquisa, resolvemos nos deter um pouco mais sobre a primeira, pois esta apresenta uma série de elementos de extrema relevância para nossa pesquisa, visto que é majoritariamente composta por jovens.
O nosso trabalho de campo, teve como metodologia a aplicação de 18 questionários compostos por 9 perguntas abertas e uma entrevista ao líder religioso da Igreja Bola de Neve, além da observação participante em 4 cultos da igreja.

Desenvolvimento
Antes de irmos a campo, realizamos contatos telefônicos com a Igreja para explicarmos que éramos estudantes da UFRJ e que desejávamos saber sobre a possibilidade de realizarmos a entrevista e aplicarmos os questionários. Falamos a respeito dos objetivos da nossa pesquisa e fomos orientados a procurar pela líder do grupo de jovens na igreja, a Julia (18 anos).

No dia 31 de maio fomos pela primeira vez ao culto religioso que ocorre aos domingos à noite e tem início às 19:30h. Ao chegarmos a Av. do Pepê nº 1124, nos deparamos com uma fachada, de frente para a praia de Barra da Tijuca, que lembra uma academia: cores vivas e imagens de esportes radicais. À porta, fomos muitíssimo bem recebidas por um grupo de jovens. Perguntamos então pela Julia, que rapidamente foi contatada e veio ao nosso encontro.
Apresentamos-nos a ela e esclarecemos o teor da pesquisa, bem como entregamos a nossa carta de apresentação e aproveitamos para pedir a sua ajuda na orientação em relação à aplicação dos questionários.
Muito solícita, a jovem nos falou um pouco sobre a igreja e nos mostrou o espaço físico: no primeiro pavimento há uma série de cadeiras e dois telões por onde acompanham os cultos, em tempo real, as pessoas que não encontrarem lugar no andar de cima, onde a cerimônia acontece. Além dos telões, há alguns quadros que variam de imagens bíblicas à paisagens de praia. À direita da porta de entrada há uma lojinha onde são vendidos CDs, bíblias, camisas, garrafas térmicas, dentre muitas outras coisas, com o logo da igreja. Há também banheiros, salas onde ocorrem as reuniões das crianças, e um espaço que (apostamos!) tira qualquer evangélico tradicional do sério: uma pista de skate recheada de adolescentes!
No segundo pavimento fica o salão onde acontecem os cultos: na porta de entrada, a imagem de coqueiros e uma maçaneta em forma de prancha. Lá dentro, um amplo espaço com várias fileiras de cadeiras voltadas para o palco com o famoso púlpito em forma de prancha. E mais alguns quadros de praia. No terraço ficam a cantina e algumas mesinhas.
Começa o culto. O período de louvor acontece à meia luz. Um dos membros, sentado ao nosso lado, nos informou que isso acontece para que as pessoas fiquem mais a vontade para expressar seu louvor da maneira que lhe parecer mais apropriada, sem se preocupar que os demais a vejam. As músicas variam entre reggae, rock, e ritmos mais melódicos e as reações são variadas: há os que pulam, que dançam, que levantam os braços, gritam, choram, cantam... enfim, a tática da luz apagada funciona mesmo.
Após o período de louvor, um membro da igreja vai até o púlpito para dar um testemunho, ou seja, contar a respeito de uma graça alcançada. A partir daí já percebemos a proposta da igreja: clareza e descontração. A moça que subiu ao palco, falou para as cerca de 400 pessoas presentes, como se estivesse entre amigos (com direito a muitas, muitas gírias). Terminado o testemunho, o pastor assume a reunião com uma proposta: “Vamos abrir a Bíblia no livro do tal do profeta Ezequiel? Mas se você não sabe onde fica, não esquenta, não! Eu vou ler pra você aqui.” A partir daí, fora o palavreado, o culto não diferiu em nada das igrejas tradicionais, ou seja, a mensagem em si, não era portadora de nenhuma ousadia destradicionalizante.
A certa altura do culto, sem constrangimentos ou ameaças, é aberto um espaço para os presentes ofertarem a quantia que acharem devida. Enquanto uma moça canta repetidas vezes o refrão “eu dou com alegria”, o pastor fala sobre o destino que o dinheiro doado receberá: aluguel da sede na Barra, e de um futuro outro espaço na zona sul. “A igreja se sustenta com a sua oferta!”, diz ele.
Passado esse momento de ofertas, houve a pregação de uma mensagem bíblica por aproximadamente 1 hora e meia. Com o fim da mensagem, o pregador faz uma oração e diz aos que precisam ir embora para receberem a chamada “Bênção Apostólica”. O pastor diz ainda, que o culto não iria terminar naquele momento, pois Deus ainda agiria muito naquele lugar e na vida das pessoas que ali pudessem permanecer por mais algum tempo.
Já estava perto das 23h, quando tomamos ciência de que o culto não tinha hora para terminar. Esse segundo momento do culto, contaria com a participação dos músicos para que fosse tocada um melodia repetidas vezes, enquanto pessoas eram oradas pelo pastor. Durante a oração ou “ministração”,
muitas pessoas caíam no chão, outras cantavam e algumas dançavam.
Contudo, em função do horário bem avançado, deixamos a igreja nesse dia sem que o culto tivesse terminado. Acreditamos que o mesmo terminou não antes da meia-noite.

Merece destaque a muito bem elaborada organização da igreja. Há uma alocação dos membros em grupos (ou ministérios) para distribuição das atividades da igreja, quais sejam: zeladoria, atalaias (organização dos cultos, recepção de visitantes), infantil, arte, intercessão, surf, jiu-jitsu, louvor, diáconos. Além desses grupos, há também o Ministério da Ação Social que faz campanhas de arrecadação de roupas e alimentos e visita hospitais e presídios.

No dia 21 de junho, retornamos a igreja pela manhã para confirmarmos a entrevista com o líder que estava substituindo o pastor em razão de uma viagem que fazia. Chegamos ao final do culto, mas durante o tempo que esperávamos para falar rapidamente com o referido líder religioso, observamos atentamente a ornamentação do templo já quase vazio. Trata-se de um templo bem distante dos tradicionais templos evangélicos, pois apresenta peculiaridades muito interessantes. Dentre elas, podemos relatar o cenário composto por um painel que reproduz a orla da Barra da Tijuca, o chão com um carpete que imita um gramado, alguns quadros com pinturas de ondas “radicais” e fundo do mar e como não poderia faltar, um púpito em formato de prancha de surf.
Quando conseguimos falar com o líder, aproveitamos para pedir autorização para tirar algumas fotos no culto da noite. Ele então concordou.
No retorno à igreja na parte da noite, conversamos cerca de 30 minutos com o líder e descemos para o culto onde ouvimos mais um testemunho e acompanhamos o momento do ofertório. Em seguida, recebemos um crachá para tirarmos fotos pela igreja. E feito isso, recolhemos mais alguns questionários e fomos embora.

No dia 10 de julho, fizemos contato telefônico com a líder dos jovens, Júlia, para confirmarmos nossa ida ao culto dirigido pelos jovens que ocorre todas as sextas-feiras à noite. Chegando lá, tiramos mais algumas fotos, recolhemos o restante dos questionários e assistimos um pouco do culto. Vale dizer, que esse culto é especifico para jovens e feito pelos jovens. As letras das músicas podem ser acompanhadas por uma tela que desce do teto da igreja, onde não só as letras são projetadas, mas também lindas paisagens paradisíacas.
Assim, nossas visitas a campo chegam ao fim.


Questionários
· Idade:
18 anos – 2 pessoas
19 – 1
20 – 3
21 – 2
24 – 2
26 – 2
27 – 2
28 – 1
29 – 3

· Sexo:
Feminino – 11 pessoas
Masculino – 7 pessoas

· Local de residência:
Barra da Tijuca – 6 pessoas
Jacarepaguá – 4 pessoas
Recreio – 3 pessoas
Rocinha – 1 pessoas
Vargem Pequena – 1 pessoa
Tijuca – 1 pessoa
Leblon – 1 pessoa
Cascadura – 1 pessoa


· Profissão
Estudante – 7 pessoas
Radialista
Policial
Secretária executiva
Vendedor
Promotor de merchandising
Bancário
Prof. de Ed. Física
Funcionária Pública
Hoteleira
Fonoaudióloga
Estoquista

· Por que escolheu essa igreja?
Porque há liberdade de estilos – 3 pessoas
Porque fui bem recebido – 3 pessoas
Descontração/clareza no modo de pregar a palavra – 2 pessoas
Porque a presença de Deus/Espírito Santo é real neste lugar – 2 pessoas
Porque foi feita pra mim – 2 pessoas
Não há cobrança do dízimo – 1 pessoa
Os cultos são alegres – 1 pessoa
Porque é a igreja de todas as tribos – 1 pessoa
Porque é style – 1 pessoa
Porque gostei – 1 pessoa
Porque tem pessoas iguais e mim – 1 pessoa
Porque é do surfe – 1 pessoa
Porque é muito irada – 1 pessoa
Não responderam – 2 pessoas

· Qual a importância da igreja na sua vida?
É onde ouço a palavra de Deus e alimento minha fé/ espírito – 5 pessoas
É como uma família pra mim – 3 pessoas
É onde encontro os meus amigos – 3 pessoas
Foi onde conheci Jesus – 2 pessoas
É um lugar de comunhão da galera – 2 pessoas
Transformou a minha vida – 2 pessoas
Onde encontro alegria e paz – 1 pessoa
Não consigo imaginar minha vida sem a igreja – 1 pessoa
É onde renovo as minhas forças – 1 pessoa
É um suporte espiritual – 1 pessoa
É onde recebo o que preciso – 1 pessoa

Conclusão

Com base nas visitas a campo, na entrevista realizada e nos questionários que aplicamos, podemos perceber que o perfil desses evangélicos de fato ainda passa por uma grande alteração.
Dentro da mesma congregação, é possível ver pessoas com comportamentos, trajes, posturas e linguagens diferentes. Embora o público seja majoritariamente jovem, notamos um número considerável de pessoas acima dos 29 anos nos cultos de domingo à noite, inclusive pessoas idosas.
Os jovens evangélicos mostram-se fortemente comprometidos com as atividades relacionadas à igreja, ou seja, com o louvor (os músicos), com a receptividade aos visitantes e aos membros como um todo, com as viagens, festas, etc.
Diferentemente do que é imaginado e ouvido por muitos, a igreja não pode ser vista como algo homogêneo em termos de postura, linguagem e atitudes. Muitos se apresentam indubitavelmente como pessoas que tem uma ligação explícita com o surf ou com outros esportes. Já outros, irão apresentar certa afinidade com os símbolos ligados ao rock. E muitos, por outro lado, se apresentam de maneira absolutamente tradicional e sem diferenciais aparentes.
Contudo, é inegável que essa igreja tem as suas ações voltadas para a juventude e, ao contrário do que a imagem sugere, o foco são os jovens em geral, surfistas ou não – “é a igreja de todas as tribos”, como nos respondeu um jovem membro no questionário aplicado – o que torna esse rebanho tão diverso. Tudo na igreja, desde a decoração, até a linguagem, passando pelas atividades oferecidas (jiu-jitsu, teatro, dança, surf...) reflete juventude. Uma jovem de 18 anos deu a seguinte resposta a pergunta “Por que você escolheu essa igreja” no questionário: “Deus foi tão bom que inventou uma igreja que é a minha cara, muito irada. Amo tudo o que tem nela!”
Outro atrativo para os jovens é a (relativa) liberdade de que dispõem na igreja devido a (aparente) doutrina flexível. Como a igreja não se coloca contra qualquer tipo de elementos estéticos (piercings, tatuagens, determinados cortes de cabelo e roupas...) ou ritmos musicais, ao entrar na igreja, não se faz necessária ao jovem, uma mudança externa, o que, observamos nos questionários, é muito valorizado por eles. Destacamos aqui a resposta de uma jovem de 20 anos: ”O Bola de Neve é uma igreja onde você é recebido com amor, além de dar lugar à liberdade. Religião não muda seu estilo, seu jeito, Jesus muda só o nosso coração, o restante é conseqüência.”
Mas o aspecto que mais chama a atenção na Bola de Neve, definitivamente, é a linguagem. Percebemos que não há qualquer esforço por parte de nenhum participante da igreja para manter uma linguagem formal, ao contrário, fizeram da descontração uma marca pessoal. Expressões como “Deus operou um milagre irado na minha vida!” ou “Esse culto tá bombando!” são ditas com naturalidade durante os cultos. As complexas teorias teológicas também passam longe das reuniões: as mensagens são trazidas da forma mais clara possível e, geralmente, de modo divertido.
Esse conjunto de elementos faz da Bola de Neve Church um cenário muito propício para que os jovens se sintam mais a vontade em freqüentar uma igreja evangélica. Mas, por trás de toda essa pintura inovadora, ainda persiste uma boa parte da doutrina evangélica tradicional: nada de bebidas alcoólicas, palavrões, músicas profanas, baladas, sexo antes do casamento e namorados não-convertidos.
Há um esforço (não admitido por seus líderes religiosos) em atrelar a imagem da igreja à juventude, o que acaba por ter um duplo resultado: faz com que, em um primeiro momento, as pessoas duvidem da seriedade da igreja (como fez Rodolfo Abrantes e, admitimos, nós também) e, por outro lado, atrai jovens em busca de novas formas de expressão da fé.

domingo, 12 de julho de 2009

À meia-luz

O período de louvor na igreja é realizado à meia-luz, para que as pessoas fiquem mais a vontade para expressar seu louvor da maneira que lhe parecer mais apropriada, sem se preocupar que os demais a vejam. Os ritmos variam entre lentos e agitados. Nas músicas mais aceleradas, há sempre um "incentivo à agitação" por parte da pessoa à frente da reunião.

A Salvação pelo Rock (Resenha)

A Salvação pelo Rock: sobre a cena underground dos jovens evangélicos no Brasil
Esse artigo foi escrito pelo antropólogo Airton Luiz Jungblut e publicado na revista Religião e Sociedade (RJ, 2007). O autor inicia o texto falando sobre o crescimento acelerado do número de evangélicos no Brasil nas últimas duas décadas e associa esse fenômeno às transformações no modo de ser dos evangélicos. Em seguida, elenca uma série de fatores aos quais ele atribui a causa dessas transformações, quais sejam: a organização das igrejas em grupos cada vez maiores (os cultos espetaculares de massa), o que diminuiu a capacidade de imposição de regras comportamentais; a maior abrangência de segmentos da classe média que geralmente são pouco afeitos a doutrinas rígidas; a inserção das igrejas em novos espaços; a influência “destradicionalizante” das novas gerações e da própria dinâmica histórica do mundo. Assim, o que tem ocorrido é a apropriação de elementos profanos (mídia, internet, moda, determinados estilos musicais, etc) para fins evangelísticos. Destaca-se nessas transformações um movimento voltado para a juventude, destinado tanto aos jovens já convertidos, quanto aos que se pretende converter. Esse processo inclui a criação de espaços e abordagens mais condizentes com as áreas de interesse dos jovens dentro das igrejas.
Feita essa contextualização, o objetivo do autor é analisar os dilemas identitários que surgem nesse processo de apropriação de elementos profanos, especialmente o rock, estilo musical aparentemente inconciliável com fins evangelísticos, devido aos elementos estético-comportamentais que lhe são atribuídos (uso de drogas, sexo desregrado, signos satânicos...).
O rock gospel brasileiro começa a ganhar força na década de 80 e tem dupla finalidade: atingir os jovens ainda não convertidos e a destradicionalização das igrejas. Jungblut aqui, volta o foco para uma vertente específica do rock: o heavy metal, ou no caso gospel, o white metal ou metal cristão. Como esse ainda não é um estilo musical com grande aceitação entre os evangélicos, verifica-se a crescente criação de espaços (igrejas, ministérios, casas de shows...) dedicados aos seus adeptos. O conjunto desses espaços recebeu o nome de “cena underground cristã”. No Brasil, esses espaços se constituem refúgios para os jovens metaleiros que são impedidos de expressa sua fé nas igrejas tradicionais, devido aos seu comportamento pouco ou nada condizente com as doutrinas puritanas, afinal, apesar de todas as consideráveis mudanças pelas quais as igrejas evangélicas vem passando, o rock ainda não é bem visto nesse meio por ser associado a uma mundanidade não passível de apropriação para fins evangelísticos.
Assim, observa-se a criação de um movimento de defesa da não-malignidade do rock. Os defensores dessa causa partem do princípio que todo gênero musical pertence a Deus, mas o diabo se apropriou do rock, associando-o a práticas pecaminosas. “Não se trata, portanto, de apropriar-se de algo originalmente satânico para fins evangelísticos, mas sim de retomar algo que pertence a Deus, já que este seria o verdadeiro criador de todas as coisas. Nesta lógica, todas as coisas do mundo são neutras, podendo tanto ser usadas para benefício de Deus ou de Satanás” (pg. 149).
A missão desses jovens metaleiros cristãos no entanto, é bastante complexa: buscar nesse
gênero musical aquilo que pode (e deve) ser reapropriado, em detrimento dos elementos satânicos tão intimamente associados e ele, em um movimento simultâneo de incorporação (sonoridade, ritmo, técnicas musicais, referências estéticas) e recusa (linguagem inapropriada, uso de drogas, sexo desregrado, irreverência).
Em seguida, o autor faz um pequeno resgate da trajetória do ex-vocalista dos Raimundos, Rodolfo. Ele teve sua carreira iniciada nessa banda brasiliense que fez muito sucesso nos anos 90 com músicas que misturavam hardcore e forró. As letras continham palavões e referências explicitas ao sexo.
Em seu apogeu (2001), Rodolfo se converteu a uma igreja Pentecostal e deixou a banda. Em
seguida, Rodolfo formou a banda chamada Rodox e passou a testemunhar sobre sua conversão pelo Brasil. Ele abordava em seu testemunho a vida que tivera, onde abundavam sexo e drogas. Contudo, a nova banda não permaneceu por muito tempo, sendo desfeita em 2004 pelo fato de Rodolfo ser o único integrante evangélico. Para ele, os demais integrantes não de compromenteram com a sua proposta evangelizadora.
Por outro lado, a conversão de Rodolfo significou um grande ganho para o universo underground evangélico brasileiro porque tratava-se de uma figura admirada no mundo do rock mundano e que passava a prestigiar o universo underground evangélico tido por muitos como “careta” e “piegas”. Além disso, para os roqueiros evangélicos isso foi uma representação de que o seu universo tem atrativos suficientes para pessoas importantes do rock nacional.
Já no meio não-evangélico, também houve muitas manifestações contrárias a sua conversão, principalmente por meio da internet (em webforuns, em chats, em grupos de discussão, comunidades virtuais, etc.) reivindicando não só a volta dos Raimundos, mas também que Rodolfo deixasse de lado a sua postura evangélica.
As comunidades do orkut que reclamava a volta dos Raimundo tem como título “Rodolfo, volte pra drogas”, “Rodolfo, por favor volte pras drogas! Nem Deus te merece assim!”, entre outras.
A partir disso, passou a existir uma verdadeira guerra verbal entre os defensores dos Raimundos e os defensores do Rodolfo evangélico. Nesse embate, é colocada uma questão difícil de ser aceita pelos não-evangélicos, ou seja, a possibilidades de que o repertório de símbolos, padrões estéticos e comportamentais próprios do universo cultural underground, associados a certas modalidades do rock possam ser apropriados pelos evangélicos com uma finalidade distinta da finalidade “mundana”.
Para os evangélicos vinculados a essa cena underground basta adulterar os sinais internos aos símbolos manipulados existentes nesse jogo identitário. Assim, há uma transposição do pecaminoso para o virtuoso, de satânico para divino, de irresponsável para edificante, de lascivo para casto, de licencioso para abstêmico, etc. Porém, os não-evangélicos apostam que tal comportamento ocorre apenas para ocultação de uma pieguice evangélica.
Essa adulteração semântica é algo colocado como sendo de extrema complexidade, pois ao mesmo tempo em que os jovens evangélicos precisam estar alinhados com o repertório de onde retiram o material identitário, simultaneamente, devem ter um comportamento condizente com as crenças e os padrões de moralidade próprios ao cristianismo evangélico que frequentemente seguem padrões e valores completamente antagônicos aos daqueles que imitam.
Cotidianamente, dilemas e questões são vivenciadas pelos jovens evangélicos tais como: um jovem evangélico poder ou não falar palavrão, fazer ou não sexo antes do casamento, piercings e tatuagens aceitáveis ou não para um cristão evangélico, etc.
O autor ainda coloca, que de acordo com o caráter “antiestrutural” do universo underground juvenil contemporâneo é absolutamente natural colocar-se ideologicamente contra a ordem social e cultural estabelecida, alimentando a rebeldia, a irreverência, a falta de compromisso dos jovens com valores tradicionais e a legalidade institucionalizada na sociedade. Mas estar na chamada “contramão do sistema” é algo relativamente fácil para um garoto “mundano”, não para um roqueiro evangélico.
Como os jovens evangélicos não apresentam esse caráter “antiestrutural” com tanta tranqüilidade, são frequentemente taxados como “caretas”, “panacas” e “cuzão”, isto é, por ficarem distintos do que realmente caracteriza um garoto underground.
Durante os debates relacionados contracultura evangélica, está sempre presente uma tentativa do alcance do equilíbrio entre o permissível, em relação à mundanidade, e o desejável em relação à cultura evangélica.
Se por um lado existe a preocupação em não prejudicar a postura underground dos evangélicos em função dos tradicionalismos, por outro lado, se tem uma desqualificação da pretendida condição de autênticos undergrounds por alguns críticos ao movimento. Isso, leva a uma radicalidade de postura evangélica em relação a mundana, onde muitos jovens evangélicos afirmam: “contraculturais somos nós, pois somos odiados, desprezados e escarnecidos pelo mundo”.
Embora afirmem que eles são os que realmente tem um comportamento contracultural que vai de encontro à “decadência generalizada dessa sociedade moderna”, considerada consumista, materialista e hedonista, existem algumas ressalvas quanto a isso. O fato, por exemplo, de determinados jovens que se dizem adeptos desse movimento negar o sexo desregrado, o consumo de álcool e outras drogas, não os exime de práticas consumistas. Nesse caso, não estariam negando o consumo, por exemplo, e sim algumas formas de consumo tendo em vista que os jovens evangélicos também são fortes consumidores do mercado musical, dos esportes, da própria moda (style), etc.
De acordo com as Ciências Sociais, a categoria “juventude” abarca uma série de questões referentes às tensões, conflitos, divergências, desentendimentos geracionais etc. Esses transtornos levam os jovens a tornar-se objeto de estudos dos diversos campos do saber (Direito, Psicologia, Pedagogia, Sociologia, criminologia, etc.), cada um com um tipo de olhar.
A juventude tida como um “problema” inquietante é algo recente na cultura ocidental em virtude do nível de complexidade social atingida, tornando a fase de construção da identidade do jovem uma etapa desafiadora, dadas as múltiplas opções identitárias no percurso rumo a fase adulta.
Destaca-se que esse processo transitório dos jovens à fase adulta tende a ser dramático porque enfrentam crises importantes relacionadas às fases anteriores da infância, ao mesmo tempo em que desejam “instalar ídolos e ideais duradouros como guardiões de uma identidade final”.
Esses dilemas e conflitos podem ser vistos claramente quando tanto os jovens não-evangélicos como os evangélicos undergrounds, lutam intensamente pela contrastividade identitária em relação ao tradicional posto, seja na religião ou no que está legitimado socialmente.
Todavia, para os jovens evangélicos a contrastividade identitária é mais difícil em razão da ambigüidade existente entre dois grupos distintos: os evangélicos classificados como tradicionais e com que não compartilham padrões estéticos nem comportamentos, e os que habitam o universo underground “mundano”, cuja crença religiosa não é compartilhada.
Os jovens evangélicos, tem que mostrar que podem incorporar e manipular o repertório simbólico “mundano”, sem por isso, deixar de afirmar explicitamente sua confissão de fé. Isso significa dizer que os jovens evangélicos partilham de alguns gestos, roupas e gostos dos roqueiros “mundanos” ao mesmo tempo em que defendem valores morais e religiosos que os fazem cristãos.
O conceito de “comunidade estética” é fundamental para tentar-se compreender o formato organizacional assumido pelos pertencimentos estéticos em questão. Assim sendo, as comunidades estéticas seriam formadas mediante a identificação coletiva e compartilhada de valores estéticos de alguma ordem de produtos culturais. A presença dessas “comunidades estéticas” na sociedade contemporânea se dá em decorrência da “estetização da vida”, ou seja, uma busca incessante dos indivíduos por novas experiências, novos valores, novos vocabulários, etc.
A explosão do movimento Punk, a partir do final dos anos setenta aparece como um colaborador para a proliferação de comunidades estéticas no meio urbano. Ocorria então, um aumento de tribos que elegiam “a música como elemento centralizador de suas atividades e da elaboração de suas identidades”. Para isso, seria necessário um grande investimento na construção de um estilo de aparecimento (modo de vestir, expressão facial, postura de corpo e gesticulação).
Essa explosão de comunidades, possivelmente corroborou para a criação de um movimento underground evangélico com bandas de rock, estilos alternativos de música, comportamento, etc. O estilo de vida underground, antes pertencente a uma camada restrita da sociedade, popularizou-se.
A desradicalização política e estética do universo underground em função do inchaço apresentado por ele, proporcionou a entrada de “comunidades estéticas” nesse universo como: jovens pouco alternativos (skinreads, strainghtedges), os “punks de butique”, os emos e os evangélicos undergrounds. Logo, as tribos evangélicas de rock legitimam a sua entrada no mundo underground, assim como outras comunidades estéticas.
A partir desse quadro, são feitas indagações sobre o que realmente teria acontecido com o mundo underground. Chega-se a conclusão, de que teria havido simultaneamente o enfraquecimento do repertório simbólico nesse universo, possibilitando a entrada dos jovens evangélicos e ao mesmo tempo o enfraquecimento desse repertório simbólico underground pela entrada dos jovens evangélicos.
Dessa forma, o autor pontua que refletir sobre esse movimento, auxilia na compreensão desse processo de liberação de certas áreas aos evangélicos antes consideras mundanas strictu senso.
Desta feita, ressalta-se que os grupos identitários permitem a existência de um rock underground dentro das igrejas evangélicas brasileiras não como um movimento homogêneo, mas sim como um movimento que apresenta divergências não só entre eles, mas com as várias tribos, com os não-evangélicos e com os evangélicos como um todo. ‘Trata-se , talvez, daqueles recorrentes fluxos de convergências e divergências entre o geral e o particular que, de muitas formas, parecem caracterizar, há muito tempo, o crescimento e a ...fragmentação diferencialista da cristandade protestante” (pg.160).


*Jungblut, Luiz Airton. A salvação pelo Rock: sobre a "cena underground" dos jovens evangélicos no Brasil. Revista Religião e Sociedade, p. 144-162, Rio de Janeiro,2007.

sábado, 11 de julho de 2009

Deus é Pop



Esse é o título da reportagem de capa da revista Época nº 578 (15/06/09). O repórter Nelito Fernandes fala sobre o crescimento da religiosidade entre os jovens e da busca desse segmento da população por novas formas de expressão da fé cristã. O texto tem por fundamento uma pesquisa do instituto alemão Bertelsmann Stifung, realizada em 21 países, que revela que o jovem brasileiro é o terceiro mais religioso do mundo: 95% dos brasileiros entre 18 e 29 anos declaram-se religiosos e 65% afirmam ser "profundamente religiosos". Mas o que intrigou os pesquisadores foi a aparente contradição entre o percentual encontrado nessas questões em comparação ao questionamento seguinte: quando indagados sobre a prática da fé, apenas 35% disseram viver de acordo com os preceitos religiosos. Isso faz do índice brasileiro de coerência religiosa um dos mais baixos. A antropóloga Regina Novaes explica: "O jovem tem fé, mas não aceita o pacote pronto institucional". Ou seja, as práticas religiosas, tal como se apresentam, não tem correspondido às necessidades e anseios dessa parcela da população.




E é daí que surgem as igrejas inovadoras e suas doutrinas flexíveis, com destaque especial para as igrejas evangélicas. Nelito Fernandes prossegue sua reportagem:


"A capacidade de se adaptar ao espírito do tempo para responder aos anseios dos jovens parece ser um trunfo dos evangélicos - que, em termos estatísticos, avançam sobre as demais religiões no Brasil. "Sem dúvida, um dos principais fatores que explicam a explosão evangélica no país é essa característica de se ajustar aos valores da sociedade. O neopentecostal aceita coisas que eram impossíveis há três décadas", diz a antropóloga Cristina Vital, do Instituto de Estudos da Religião, do Rio de Janeiro. Cristina lembra que o catolicismo também passa por uma transformação, muito menos radical.


Embora exista uma tentativa de fazer frente ao apelo pop dos evangélicos, a imagem da Igreja Católica parece velha para boa parte dos jovens. Quando um bispo tenta impedir que uma menina de apenas 9 anos possa fazer aborto após ter sido estuprada, contrariando uma garantia legal e uma recomendação médica, ele contribui indiretamente para afastar do catolicismo até jovens fervorosos.


A socióloga Dulce Xavier, do grupo Católicas pelo Direito de Decidir, diz que as posições intransigentes da Igreja afastam os jovens. "A Igreja Católica está parada no tempo na questão das liberdades individuais. O jovem é contestador não aceita isso", diz Dulce. O teólogo Fernando Altmeyer, professor da PUC de São Paulo, diz que a igreja acredita e quer, sim, que seus fiéis sigam seus preceitos. Ele diz que o papa Bento XVI tem seguido uma linha coerente: prefere um cristianismo de qualidade mesmo que minoritário. "(...) a Igreja não vai barganhar seus valores em busca de popularidade", diz Altmeyer. Para ele, o grande desafio dos católicos é contextualizar seus valores e explicá-los aos jovens de uma forma que eles entendam."


Enquanto isso, entre as denominações evangélicas, a diversidade é cada vez maior: igrejas para metaleiros, garotas de programa, lutadores de jiu-jítsu, homossexuais, surfistas, skatistas...

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Rodolfo Abrantes (Parte3)

Em 2002, como havia planejado, Rodolfo criou uma banda de punk/rock gospel juntamente com músicos que haviam saído de outras bandas ( incluídos aí dois companheiros do Raimundos) que recebeu o nome de Rodox. Apesar das letras mais comportadas, o estilo e a qualidade da música se mantiveram, o que serviu de consolo para alguns dos fãs inconformados com o fim dos Raimundos. Assim, o Rodox, apesar da natureza evangélica de suas músicas, ganhou espaços onde, até então, esse estilo musical não tinha muito acesso, como a MTV, o que foi considerado uma grande vitória para a parcela de evangélicos adeptos a esse estilo musical.
Nas palavras de Airton Jungblut (2007): "A conversão de Rodolfo apresentava-se, para os rockeiros evangélicos, como um endosso qualificador de seu universo, uma manifestação inequívoca de que este teria lá seus atrativos estéticos e de que por ali poderiam transitar tranquilamente figuras importantes do rock nacional."
As letras do Rodox não possuiam qualquer vestígio de pornografia ou palavrões, tornando-se assim o extremo oposto das composições do Raimundos, mas as diferenças musicais entre os grupos acaba aí. Apesar de dividir opiniões no meio evangélico, o rock gospel ou white metal, tem adquirido um número cada vez maior de defensores. A maior bandeira desse grupo crescente é a defesa da idéia de que "o repertório de símbolos, padrões estéticos, e comportamentos (...) associados a certas modalidades do rock pode ser legitimamente apropriado (ou expropriado) para outra finalidade moral distinta daquela que o anima na mundanidade" (Jungblut, 2007). Com esse agumento, defende-se o uso de elementos estéticos e comportamentais típicos de rockeiros mundanos para fins evangelísticos, sendo o Rodox um dos grandes exemplos desse movimento, como é possível notar nos vídeos abaixo. O primeiro mostra um Rodolfo ainda não-convertido no show de sua antiga banda, o Raimundos. O segundo é um show do Rodox, a banda gospel do mesmo vocalista. Mas retirando o som fica difícil de ditinguir.

Vale reforçar que, apesar da aparência, a letra da música do segundo vídeo é bem tradicional. Eis um trecho (porque imaginamos que, assim como nós, você também não conseguiu entender o que ela diz, né? hehe): “Vi a queda de reis perante um nome só/É por amor que ainda existo/Hoje renasço em Cristo, mais um cego em Jericó/Sei que me ouviste quando ajoelhei no chão/Pedi perdão e disse adeus ao homem triste/Vou me entregar a Ti, por tudo que aconteceu/E pelo que há de vir/Quando segurou a minha mão/Finalmente eu soube que era o Deus vivo quem/Esteve lá quando estava só/Mais de uma vez, eu só quis ficar bem/E fiquei bem melhor” .
Para decepção dos fãs, evangélicos ou não, o Rodox não teve vida longa, desfazendo-se em 2004. Segundo Rodolfo, a banda havia sido criada para levar a mensagem do evangelho ao meio secular e não estava cumprindo seu papel, pois o demais integrantes do grupo não partilhavam de sua proposta evangelística. Atualmente o cantor segue carreira solo e já lançou dois cd's pela Bola Music (gravadora da Bola de Neve Church). As músicas não são tão pesadas, mas Rodolfo ainda canta rock e reggae, rimos frequentes nos cultos da igreja.